o Maurício

O Maurício é um gajo porreiro. Um pouco ingénuo, mas porreiro. Às vezes dá-lhe assim a modos que uns “amokes”, fica mais esperto, pensa. Mas é um gajo porreiro.
O Maurício gosta de brincar, gosta de pregar partidas, é uma espécie de palhaço residente cá do sítio. Pró Maurício a vida é uma festa. E é um gajo porreiro.

E grande. O Maurício é grande. Para apertar o nó da gravata sobe sempre a um banquinho e torce o pescoço para caber no espelho. Deve sentir vertigens, com o ar rarefeito lá de cima. Coitado! É mesmo grande, o Maurício. Há um ano, quando chegou a este lado do Atlântico, o Maurício é brasileiro, dava um passo em frente para apertar o cinto das calças. Agora dá um e meio. Diz que a culpa é dos pasteis de nata. Pode até ser, mas desconfio. Cá para mim é mais das feijoadas duplas, dos cozidos reforçados de enchidos e dos quatro papo-secos que enfia no bandulho a cada pequeno almoço. E não vou falar nas bolachas que anda constantemente a roer! As formigas fazem fila pró canto dele. É grande, portanto, o Maurício. E porreiro. O Maurício é um gajo porreiro!

A nossa sala de reuniões da cave é um tanto abafada, com uma mesa comprida rodeada de cadeiras de napa a toda a volta. O Maurício estava à cabeceira a apresentar já-não-sei-bem-o-quê. Uma teoria imbecil qualquer sobre as virtualidades da utilização do VB em detrimento do C++. Uma seca que se iria prolongar pela tarde fora. Metade da malta, se não dormia disfarçava mal e a outra metade distraía os olhos a contar as manchas do tecto. Só o Octávio parecia muito interessado. Mas o Octávio parecia sempre interessado. Eu ia preenchendo a folha à minha frente com uns rabiscos dignos de figurar numa rocha de Foz Côa enquanto não ouvia mesmo nada do que ele ia debitando.

Farto desta pasmaceira, tinha de fazer algo para a segunda parte. Aproveitei a hora de almoço e troquei os rissóis de camarão e as empadas de vitela do Chico Jaburdas por uma ida à farmácia em frente. Comprei uma seringa e injectei três copos de água bem cheios na cadeira do Maurício.

Após o repasto, com a pança bem aconchegada, a coisa começou a mudar. A habitual calma do Maurício foi-se alterando. Durante uma boa meia hora, não parava quieto, mexia-se, torcia o corpo. A cadeira parecia picar-lhe. Até que, levantando-se, passou a mão no rabo, mirou-a, espantou-se, olhou pró traseiro e disse prá malta:

“Puta vida, tenho a bunda molhada!”.

gordo

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